Thatcherismo e Reaganismo: o Neoliberalismo e a captura da alma dos trabalhadores

 


As décadas de 1980/1990 foram marcadas por profundas transformações econômicas, políticas e sociais, impulsionadas pelas lideranças de Margaret Thatcher no Reino Unido e Ronald Reagan nos Estados Unidos. Essas mudanças alteraram  as relações entre empresas e trabalhadores, promovendo a reconfiguração do mercado de trabalho, com impactos duradouros que se fazem sentir até hoje. 

O Thatcherismo e o Reaganismo são associados às políticas de desregulamentação, privatização e enfraquecimento dos sindicatos. Elas propunham aumentar a competitividade e reduzir a interferência estatal na economia, entretanto resultaram em novas formas de precarização do trabalho, como a flexibilização dos contratos e a intensificação do trabalho temporário. Enfatizavam os resultados financeiros acima da dignidade humana. Isto levou a estratégias organizacionais restritas à eficiência operacional e constituição de subjetividades não preocupadas com as condições de trabalho e o bem-estar das pessoas.

Essas políticas eram parte e um esforço das empresas para reestruturar-se e garantir sua hegemonia diante das rupturas — captura da mente à captura da alma — dos anos 1970. David Harvey, em A Brief History of Neoliberalism (2005), argumenta que o neoliberalismo emergiu como uma resposta das elites econômicas para restaurar taxas de lucro, mesmo que isso significasse agravar as desigualdades sociais.

A flexibilização dos contratos e a intensificação do trabalho temporário são propostas centrais do Neoliberalismo; o trabalhador torna-se cada vez mais distanciado do produto de seu trabalho, aceitando como natural ser mera engrenagem em uma máquina voltada exclusivamente às metas financeiras. 

Teses como gestão por resultados, terceirizações e a ideia de funcionários descartáveis exumaram valores, crenças e atitudes tayloristas e toyotistas, lubrificadas pelo fordismo, provocando uma ruptura com as subjetividades comportamentalistas e humanistas dos anos cinquenta/sessenta. Os gestores de recursos humanos, um pouco por sobrevivência, ou talvez por falta de informação e crítica, se lançaram a selecionar, desenvolver e avaliar os empregados capturando suas almas. Infelizmente, essa ruptura abriu pouco espaço para discussões éticas dos profissionais do comportamento sobre as responsabilidades sociais das organizações em garantir condições dignas aos trabalhadores.

Os profissionais do comportamento não são agentes revolucionários infiltrados e têm, sim, que colaborar para a empresa ter trabalhadores tecnicamente preparados e comprometidos. É imperativo, entretanto, que compreendam as subjetividades éticas, promovendo ambientes organizacionais que respeitem e valorizem os trabalhadores como agentes centrais no mundo do trabalho. Esse papel desafiador é fundamental para a construção de relações mais justas e equilibradas.

Nesta Captura da Alma, ainda que se respeite a subjetividade ética, é preciso questionar também quais as intervenções individuais — como as ações dos psicólogos organizacionais — terão efeito real em um sistema que objetiva mercantilizar todas as relações humanas. Ao restringir-se somente à humanização das relações arriscam-se a legitimar estruturas de exploração, mascarando as desigualdades estruturais ao invés de questioná-las, pode ser uma tentativa de reconciliar interesses contraditórios sem abordar as causas econômicas e estruturais subjacentes.

PARA SABER MAIS

Psicologia e Trabalho: Crítica à Psicologia Organizacional e do Trabalho

Marilda Iamamoto, Cortez, 1982 

Analisa a psicologia organizacional sob a perspectiva do materialismo histórico-dialético, destacando como as práticas psicológicas podem ser utilizadas para reforçar as relações de exploração no ambiente de trabalho. A autora propõe uma reflexão crítica sobre o papel do psicólogo no contexto capitalista e sugere alternativas para uma prática mais emancipatória. 

Trabalho e Subjetividade: O Enfoque da Psicologia Sócio-Histórica

Fernando González Rey  - Cortez - 2003

A relação entre trabalho e subjetividade, analisando como as condições de trabalho afetam a construção da identidade e a saúde mental dos trabalhadores. A obra utiliza o materialismo histórico-dialético para criticar as práticas organizacionais que desconsideram o impacto humano das relações de produção.